Portal Administradores – Abril, 2014
Nos últimos dias, eu me dediquei à leitura do inquietante livro de Niels Pflaeging chamado “Liderando com Metas Flexíveis” (Beyond Budgeting). O livro busca questionar algumas das mais arraigadas práticas e métodos de gestão, como metas fixas, planejamento estratégico, orçamentos e muito mais. Uma resenha sobre o livro ficará para as próximas semanas, com análises mais aprofundadas.
Por ora, gostaria de compartilhar um pequeno trecho, onde Pflaeging analisa as culturas empresariais a partir de quatro tipos de personalidade, cada uma delas representada por um deus grego (Zeus, Apolo, Atena e Dionísio). A análise de Pflaeging é feita a partir de outro livro chamado Deuses da Administração, publicado em 1978 por Charles Handy:
“(…) As culturas organizacionais que são representadas pelo carismático pai e chefe dos deuses, Zeus, são comandadas pela pura força de vontade, pelo respeito com o talento superior do líder e pelo prazer de fazer parte de um círculo íntimo. Tais culturas funcionam da melhor maneira em empresas do tipo startup (…)”
A cultura de Apolo, que segundo Handy dominou as grandes corporações durante as últimas décadas, caracteriza-se por regras, papéis e procedimentos rigidamente definidos, bem como por um estilo de gestão sustentado pela hierarquia. Tais culturas funcionam da melhor maneira em mercados e segmentos estáveis e previsíveis.
A cultura da Atena, por sua vez, é colaborativa e orientada por problemas e aposta em equipes flexíveis de pessoas que resolvam determinados entraves e só depois voltam sua atenção para os possíveis conflitos seguintes. Do ponto de vista histórico, a cultura de Atena funcionou da melhor maneira em empresas de consultoria, agências de publicidade e outros campos em que idéias constituem o produto e onde o conhecimento especializado é empregado de modo específico.
Por fim, existe a cultura de Dionísio, o deus do vinho e do êxtase, com uma postura básica marcantemente existencialista. Ela se caracteriza por contar com especialistas independentes que se ligam a organizações de forma voluntária para perseguir seus próprios objetivos. Essa cultura funciona onde o talento individual é altamente valorizado e as pessoas são estimuladas a serem independentes. Os adeptos de Dionísio não tendem a se submeter a práticas convencionais de gestão como remuneração, promoção ou ameaça de demissão; eles preferem oferecer seus serviços no livre mercado ao cliente que melhor pagar em vez de buscar a segurança de um salário regular (…).”
Apolo na mitologia grega é descrito como o deus da divina distância, que ameaçava ou protegia deste o alto dos céus, sendo identificado com o sol e a luz da verdade. Ele fazia os homens conscientes de seus pecados e era o agente de sua purificação. Ou seja, Apolo realmente é a melhor figura para representar as grandes organizações.
No entanto, no mundo de hoje, Apolo e nossas grandes organizações são deuses decadentes, lentos, burocráticos e caretas. Suas luzes estão se apagando e há muito deixaram de ser referência profética, artística ou de eficiência e rentabilidade.
Valores de Atena e Dionísio parecem encarnar o modelo de organização que temos defendido em nossos projetos e que adotamos no Grupo ECC. Isso se traduz em uma organização adaptável, com equipes flexíveis, valores compartilhados, colaboradores multi tarefas, orientação a propósitos grandiosos e visão de todo (big picture), sem perder sua capacidade de foco e especialização.
A questão é que as expectativas de talentos, consumidores e até da sociedade (refletidas em seus valores, crenças e atitudes) parecem estar mais alinhadas às organizações com culturas do estilo de Atena ou Dionísio (típicos exemplos pós-tayloristas). A Geração Y, especialmente, parece ter sido projetada (como consumidora e como colaboradora) especificamente para organizações desse tipo. Essa história cheia de significados (espero eu) deve ser capaz de inquietar, desafiar (e até incomodar) consultores, executivos seniores, pensadores e demais lideranças a se perguntarem: Será a comparação acima um reflexo acurado da realidade?
1. E caso seja, serão Atena e Dionísio os deuses preferidos dos novos tempos?
2. A cultura organizacional de minha empresa/cliente se associa a qual deus?
3. Deveríamos mudar? É possível e desejável?